1. O novo ano de 2022 arranca verdadeiramente em 30 de Janeiro, com as eleições de onde sairão um novo parlamento e um novo governo. Nunca fui especialmente dotado para as matemáticas e estatísticas, mas não preciso disso para vaticinar que do resultado não sairá nenhuma maioria absoluta, nem para o PS, nem para o PSD. Já quanto a uma maioria parlamentar à esquerda ou à direita, isso já é outra conversa. Estas eleições eram desnecessárias. Mas Marcelo precipitou‑se, foi parcial e tendencioso. Já aqui o dissemos e não vale a pena insistir. Em resultado disso, o novo parlamento terá que discutir e aprovar, ainda este ano, dois orçamentos. Não será fácil. E quanto ao mandato do PR, estas eleições irão ser uma condicionante a marcar inelutavelmente os quatro anos que ainda lhe sobram cumprir.
Depois das eleições internas e do congresso do PSD, foi o mais que previsível toca a “Rionir”. O líder reeleito afastou de imediato quase todos os opositores internos, o que nos faz questionar acerca da habitual falta de renovação, amiguismo e clientelismo, que tanto criticou ao partido do governo. Se é assim dentro do seu próprio partido, que tipo de governo será de esperar dele? A par disso há um nítido favorecimento de Rio por parte de determinados sectores da comunicação social, que estão a levá‑lo literalmente ao colo. O que fez com que, o, neste caso, insuspeito comentarista Lobo Xavier tenha criticado em um programa da televisão que não se entendia muito bem, nem se devia permitir, que os comentários aos debates entretanto iniciados, às sondagens e tudo o resto, fossem feitos por jornalistas e comentadores, revelando à partida uma manifesta falta de isenção e as suas próprias escolhas político partidárias. A mais que patente e censurável promiscuidade dos lobbies na política e na comunicação social.
2. A par disto, há ainda um outro filme que nós já vimos, mas parece que nos esquecemos. Tem a ver com as dezenas e centenas de milhões dos fundos que virão da UE, de quem os vai administrar e conceder, e quem os irá receber. Digo que já vimos este filme, porque foi assim que aconteceu a partir de 1985, logo após aquela histórica cerimónia de 12 de Junho, no Mosteiro dos Jerónimos, em que Portugal e Espanha concretizaram o almejado desiderato de adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE), depois das longas e difíceis negociações levadas a cabo por Mário Soares e Ernâni Lopes. E para quem não se lembre, foi imediatamente após essa cerimónia que Cavaco Silva haveria de tirar o tapete ao governo em funções, iniciando o primeiro périplo governativo, das duas maiorias absolutas consecutivas que cumpriu.
Durante esse período, à custa dos dinheiros das comunidades, houve um claro favorecimento de determinadas elites, com vários escândalos financeiros à mistura, que ficaram impunes por prescrição. O país não ficou melhor, nem mais rico, nem mais moderno, não se conseguiu combater e superar a falta de produtividade, nem ultrapassar as políticas de baixos salários. Foi uma oportunidade perdida. Um dia virá a lume toda a verdadeira história deste fatídico período. Agora, o cenário corre o risco de repetir‑se. Por isso, era bom que não tivesse o mesmo desfecho. O que depende muito de nós. As três maiorias absolutas que tivemos, duas do PSD e uma do PS, deixaram‑nos amargos de boca e trágicas consequências, das quais avulta descaradamente a institucionalização de uma imensa teia de corrupção, difícil de combater e desmantela, que condiciona em muito a governação.
Tenham uma boa quinzena.