A recente entrevista de Monsenhor Luciano Guerra, dada ao Jornal de Leiria no final do ano que passou, fez-nos sentir ainda maior admiração e apreço pelo senhor reitor, do que a que já tínhamos. Luciano Guerra foi efectivamente o senhor reitor do Santuário de Fátima, indissociavelmente ligado a essa instituição e à terra, onde deixou indelével marca, para sempre registada nos anais, pelos mais nobres motivos.
Nada é por acaso, e nesse sentido, a entrevista, dada neste preciso momento e contexto, a par da nomeação e início de funções do novo bispo D. José Ornelas (presidente da conferência episcopal), são bem sintomáticos do esperançoso paradigma que se vive, iniciado pelo Papa Francisco, e do qual se espera que dê frutos, não só para a Igreja, mas para toda a humanidade. Mesmo para quem, como nós, marcadamente influenciados na juventude pelo humanismo existencialista, sartreano e camuseano, por diversas vezes nos detivemos na marcha ao atravessar o Santuário, para lhe ouvir a voz, quando celebrava e proferia didácticas e esclarecedoras homilias, difundindo a mensagem de Fátima, no seu conceito essencial, que estamos em crer, foi o senhor reitor quem mais o explanou de modo pensante. Pelo menos, nunca antes o tínhamos observado ao nível da pastoral.
Ignorantemente laicos, não deixamos mesmo assim de ler nas entrelinhas da dita, a sabedoria com que pensa e acompanha os sinais dos novos tempos deste renovado caminho que a Igreja entendeu percorrer. O modo enfático como se refere às ansiedades e desafios do mundo actual, a tudo o que agora se discute e problematiza, da crise de valores e da ausência de princípios, do combate à pobreza e às desigualdades sociais, das guerras e das diversas crises planetárias, da conservação e preservação do meio ambiente e do planeta, do problema demográfico mundial, das carências, pobreza, refugiados, migrações e todas as inerentes transformações ao nível social e político.
Nesse conspecto, ressalta e é transversal em toda a entrevista, a coerência do seu pensamento visionário, a par da obra realizada e atitude que tomou durante toda uma vida de dedicação e empreendedorismo. E todas as preocupações e interesses que acima se referiram, encontramo-los plasmados na obra que implementou e realizou e está à vista, falando por si, e que nunca é demais enumerar, mesmo que perfunctoriamente. O estímulo, abertura e cedência de espaços do santuário à sociedade civil, para realização de eventos de vária índole, colóquios, seminários e congressos. As obras marcantes que deixou no santuário e seu perímetro, não só ao nível urbanístico e arquitectónico, mas também paisagístico e de preservação e protecção do ambiente, incluindo na vertente ecológica, jardins e zonas verdes, até ao magnífico trabalho realizado em toda a zona envolvente dos Valinhos. O mesmo nunca se poderá dizer da edilidade a que pertencemos, que agiu muitas vezes até de modo contrário. Mas isso é outro assunto.
Personalidade de dimensão ímpar e dotada de invulgar capacidade, a ele muito se deve a projecção da imagem de Fátima a nível nacional e internacional, e da inerente mensagem, já mencionada, que pensou e transformou em conceito. Nesse sentido, não é exagero afirmarmos que Fátima se tornou um lugar especial, para sempre um centro de espiritualidade que se projectará pelos tempos vindouros, mesmo para além do cristianismo e do catolicismo, e por conseguinte, numa dimensão ecuménica. O que, aliás, sempre se vislumbrou no desempenho da missão que lhe foi confiada. Um mero exemplo disso, que propositadamente fazemos questão de deixar aqui devidamente mencionado, porque de relevantíssima importância espiritual, e não só, foi quando o senhor Reitor Luciano Guerra recebeu no seu Santuário, Sua Santidade o Dalai Lama, numa altura em que até o próprio Estado se inibiu de o fazer, para não ferir as susceptibilidades da República Popular da China, tendo mesmo recuado no protocolo, era na altura ministro dos negócios estrangeiros (MNE), o Dr. Jaime Gama.
Dito isto, não deixa de ser quase anedótico e de mau gosto, dizerem que está completamente desfasado da realidade. Bem-haja Monsenhor Luciano Guerra, para todo o sempre, por tudo o que fez por Fátima, pela Igreja, pelo país e por nós.
Bom ano de 2023, para todos.