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José Poças

18 de novembro, 2022

Crónica politicamente incorrecta

Passam-se coisas neste nosso Portugal que me obrigam a reflectir sobre este estranho mundo em que vivemos. Há já alguns séculos, Erasmo de Roterdão dirigiu uma violenta crítica à sociedade em que vivia. No seu Elogio da Loucura, considerava esta mesma loucura como a "mola oculta da vida" a que ninguém escapa.

Vejamos alguns exemplos actuais. Jovens activistas do clima querem salvar o planeta. Ocuparam escolas, fizeram manifestações e exigiram a demissão do ministro da Economia. Estão no seu direito democrático reivindicativo (são a geração do futuro), tendo recebido o apoio de muitas pessoas e até de líderes partidários, que estão sempre disponíveis para aparecer na televisão. Várias reflexões no entanto se impõem sobre esta temática.

- Porque é que jovens activistas protestam atirando o conteúdo de latas de sopa de tomate contra um quadro de Van Gogh (e outros artistas do Renascimento), como forma de chamar a atenção para a urgência de combater as alterações climáticas? Porque não se foram manifestar junto da embaixada da China, da Índia ou de outro dos países que por si só poluem mais de 50 % do planeta?

- Porque é que os nossos jovens não protestaram contra o facto de cerca de 800 jactos privados (já fizeram a conta a esta poluição?) se terem deslocado ao Egipto transportando os líderes mundiais que foram discutir precisamente os problemas do agravamento da poluição atmosférica?

- Porque é que, no dia a dia, assistimos a um total desrespeito das regras base de protecção ao meio ambiente? Basta visitar alguns recreios de escolas ou zonas de diversão nocturnas.

O caricato de tudo isto é que o ministro Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas e da Habitação, resolveu vir a público, solidarizar-se com os estudantes.

O que eu não percebo (serei só eu?) é como é que um ministro tomou esta posição a favor de jovens que exigem a demissão do seu colega ministro da Economia. Já agora é interessante lembrar que Pedro Nuno Santos tem estado a “torrar” o nosso dinheirinho dos impostos (mais de 4 mil milhões) na TAP que, curiosamente, é das maiores poluidoras em Portugal. É sua também a frase heróica “é preciso tirar as pessoas dos carros”. Quanto ao exemplo que dá, dificilmente o veremos deslocar-se em veículos ecológicos, até porque são de alta cilindrada os automóveis de luxo do Ministério. 

Trata-se portanto do célebre “faz o que eu digo, não faças o que eu faço” de que o Dia Europeu sem Carros que se celebra a 22 de Setembro é outro exemplo gritante. É normal nesse dia vermos alguns governantes a andar de bicicleta ou a ir para o Ministério a pé. Findo esse dia de comemorações volta tudo ao normal.

O grande problema a debater é se nesta sociedade de consumo em que vivemos, estamos dispostos a sacrificar parte dos nossos bens de consumo para podermos aliviar os problemas ecológicos deste mundo em que vivemos. E não serão meras manifestações pontuais que nos ajudarão a resolver estes problemas. Por muito bem intencionadas que possam ser.

Um último exemplo politicamente incorrecto. Pensa-se e bem em fazer uma revisão à Constituição. Quanto às notícias que têm vindo surgido, o jornal Público desta terça-feira conclui que tudo deverá ficar quase na mesma, discutindo-se apenas semânticas, como por exemplo a substituição de “Direitos do Homem” por “direitos humanos”, acrescentando que as questões verdadeiramente estruturantes como as das alterações aos círculos eleitorais e à redução de deputados não deverão avançar. 

“Quando são os ratos a distribuir o queijo…”

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