Notícias de Fátima
Sociedade Religião Lazer Educação Desporto Política Opinião Entrevistas Como Colaborar Contactos úteis Agenda Paróquia de Fátima Ofertas de Emprego
PUB

Rita Oliveira

3 de março, 2023

Manter a fé numa fé hipócrita

A fé, provida pelas várias religiões, alberga a necessidade humana de pertença, protecção e esperança. É através da fé que o ser humano procura encontrar conforto e satisfazer o que está incompleto. É uma parte intrínseca da vida humana, paradoxalmente transcendente.

Há três semanas, foi publicado um documento de 486 páginas que abalou a estrutura – e a fé – de um país manifestamente cristão católico: veja‑se a importância da nossa terra, conterrâneos fatimenses.

Sem mais poder esconder, veio a público a denúncia dos casos de abusos sexuais na Igreja, que ocorreram em Portugal nas últimas décadas. A Comissão Independente validou 512 testemunhos mas há pelo menos mais 4303 vítimas, cujos casos foram denunciados por outros. A média de idades das vítimas era de 11 anos; 52,7% meninos e 47,2% meninas.

96% dos autores dos abusos eram homens, sendo que 77% eram padres. A maior parte dos abusos ocorreu em seminários, na igreja, no confessionário, na casa paroquial e em escolas católicas.

Dos abusados, 53% continuam a afirmar‑se católicos e 25,8% são católicos praticantes. Interrogo‑me: como é que se mantém a fé numa fé hipócrita? Não critico; pelo contrário, admiro. Estas crianças tal como eu e milhares de outras ‑ foram educadas para fazer o bem, para evitar o pecado, escutaram que “os padres são os amigos de Jesus e nossos amigos”... e acabaram por perceber, da maneira mais nefasta, a hipocrisia destes ensinamentos.

Evidente que uma parte não faz o todo, por isso mantenho a minha fé: a fé numa renovação drástica dos valores e do comportamento da Igreja, e dos seus membros, mas também a fé numa tão necessária aposta social em educação sexual. Falar sobre sexualidade nas escolas não é incentivar “ao pecado”: é, pelo contrário, prevenir para que ele não aconteça e que as crianças saibam reconhecer e denunciar quando alguém infringe o seu consentimento. Só assim poderemos garantir que a inocência e o direito sob o seu corpo não lhes é logrado.

É um tema desconfortável? É. Mas mais desconfortável seria pairar na ignorância e não poder (re)agir, com tal fé num mundo melhor...

Últimas Opiniões de Rita Oliveira