A freguesia de Fátima tem vindo a ser, desde há séculos, afectada pelos mais diversos surtos epidémicos, destacando-se, de entre eles, o da cólera, o da malária ou paludismo e o da varíola. Em oitocentos, as fontes históricas coevas, tais como os registos paroquiais, são mais rigorosas, pelo menos no caso de Fátima, quanto à referência às doenças em questão e até a alguns sintomas.
Nos meados dos anos 50 do século XIX, uma grave epidemia de cólera, Cholera morbus, atingiu, por completo, o Portugal de antanho. Neste contexto, o concelho de Ourém não ficou imune ao vibrião colérico, Vibrio cholera, descoberto, em 1883, pelo alemão Robert Koch (1843-1910). Este tipo de doença infecciosa, que em parte significativa dos casos se caracteriza pela presença de vómitos, como foi o caso em estudo, tem origem sobretudo no consumo de água e alimentos contaminados.
Em Fátima, apesar de se desconhecer o número total de infectados, sabe-se, por indicação do Pe. Joaquim Mateus Vieira da Rosa, cura da paróquia, no livro de registo de óbitos que abarca o período que vai do ano de 1853 ao de 1881, que faleceram 14 indivíduos por cólera: [1] José Manuel, solteiro, filho de Sebastião Pereira, de Boleiros, a 5.8.1856, com vómito; [2] Manuel, filho de João Simão e de Rosa Maria, do Carrapeto, a 7.8.1856, com vómito; [3] Joaquim dos Santos, casado com Rosária Maria, de Aljustrel, a 9.8.1856, com vómito; [4] Maria Brígida, casada com António da Silva, de Moitas, a 25.8.1856, com vómito; [5] Joaquim Rodrigues, casado com Maria Jacinta, de Lombo de Égua, a 27.8.1856, com vómito; [6] Joaquina Maria, casada com Manuel Moreira, de Moitas, a 28.8.1856, com vómito; [7] Maria Rosa, casada com António Pereira, de Ramila, também a 28.8.1856, com vómito; [8] Manuel Luís, viúvo, de Moita Redonda, a 29.8.1856, com vómito; [9] Maria Rosa, casada com José António, de Boleiros, a 2.9.1856, com vómito; [10] Maria Antónia, solteira, de Boleiros, a 3.9.1856, com vómito; [11] Josefa Maria, viúva de José Marto, de Fátima, a 6.9.1856, com vómito; [12] Amadeu dos Santos, casado com Cândida de Jesus, de Carrapeto, a 7.9.1856, com vómito; [13] Manuel Alves, casado com Maria Joaquina, de Moita Redonda, a 13.9.1856, com vómito, e [14] Joaquim das Neves, casado com Maria Joaquina, de Moita Redonda, a 13.10.1856, também com vómito.
Os 14 defuntos mencionados supra, cuja sepultura ocorreu no adro da então igreja matriz, eram provenientes dos povoados de: Aljustrel, 1 caso; Boleiros, 3; Carrapeto, 2; Fátima, 1; Lombo de Égua, 1; Moita Redonda, 3; Moitas, 2, e Ramila, 1.
Por fim, de referir que as mortes ocorreram nos meses de Agosto, Setembro e Outubro, ou seja, um pouco mais tarde que em algumas freguesias circunvizinhas, como é o caso da de Santa Catarina da Serra, onde em Julho já havia dois óbitos. Embora, tal como para Fátima, o mês de maior actividade da cólera tenha sido, de longe, o de Agosto, começando o número de vítimas a decrescer em Setembro.